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quarta-feira, 15 de maio de 2013

Investigação em torno da esquecida Necrópole de Gondesende - A verdade que muitos desconhecem...



Texto nº 1 - Artigo recente no Jornal de Notícias


Câmara mostra relíquias históricas do concelho
Faltam verbas para escavar necrópole de Chão do Grilo
Jornal de Notícias - artigo de 09/05/2008


A Câmara de Ovar pegou em duas turmas de duas escolas do Ensino Secundário e foi mostrar-lhes alguns espaços no norte do concelho cuja relevância histórica e artística é desconhecida para grande parte da população

É o caso da necrópole Chão do Grilo, em Esmoriz. Para quem lá passa, só vê mato e eucaliptos, mas a cerca de dois metros de profundidade, encontrar-se-ão soterradas 60 sepulturas construídas entre os séculos IV e VIII.

A necrópole foi detectada, em 1931, por acaso, quando se começou a explorar uma saibreira, tendo, na altura, sido descobertas 24 sepulturas. Após uma recente prospecção do arqueólogo Gabriel Rocha Pereira, que acompanhou a visita, calcula-se que elas cheguem às seis dezenas. O que falta agora saber é, dado existir um cemitério, onde se localizaria o respectivo povoado.

Segundo a vereadora da Cultura, Conceição Vasconcelos, ainda não há verba para proceder aos estudos necessários e às escavações do espaço, mas esse é, sem dúvida, um objectivo a longo prazo. Ainda em Esmoriz, os estudantes conheceram mais em pormenor a Capela de Nossa Senhora da Penha que se crê datar de 1623, tendo passado também pela capela de São Geraldo, em Maceda e pelo cemitério antigo de Cortegaça.





Texto nº 2 - Apontamentos antigos do arqueólogo Rui Serpa Pinto


"As sepulturas são trapezoidais, dimensões da mais bem conservada: comprimento 1,65 m, largura: nos pés 0, 33 m e na cabeceira 0, 52m, altura média 0, 30 m. Estão abertas no saibro a pequena profundidade do solo (média de 0, 70 m). As paredes são formadas por pedras de tamanhos diferentes postas de cutelo ou sobrepostas formando muro, e capeadas por lajes de micaxisto. A cabeceira de algumas era formada por tijolos (...) Não apareceram vasos nem quaisquer objectos. Só numa [sepultura] apareceram ossos, restos do crânio "casco" e "duas canas das pernas ao lado de outra" (...) A escassez de dados arqueológicos não permite uma classificação rigorosa. Todavia, o facto de se tratar duma necrópole de inumação, com sepulturas trapezodais, onde aparecem tegulae e imbrices e faltam os costumados vasos cerâmicos, faz supor que se trate de enterramentos da avançada época bárbara, quem sabe se da Reconquista Cristã. Corrobora este facto a ausência completa de vasilhas votivas e a semelhança com outros cemitérios da época (Abujarda, Alcoutão, etc. (...) O povo ficou surpreendido com o achado, dizendo que as sepulturas devem ser muito antigas por que ninguém se recorda de ter ouvido falar nelas (!) e há muitos anos que o lugar é coberto de pinheiros. Entre várias reflexões, atribuem-nas a soldados mortos em algum combate". 

(Rui Serpa Pinto defende ainda que alguma ordem terá presidido aos enterramentos - veja-se "Notas arqueológicas de Rui de Serpa Pinto. Necrópole do Chão do Grilo. Esmoriz", da autoria de António Gonçalves (in Revista Dunas) que publicou os escritos daquele arqueólogo bem como alguns recortes de artigos de jornais conceituados da época; refira-se ainda que Rui de Serpa Pinto visitou a mencionada necrópole por duas vezes, aquando do seu descobrimento - é uma testemunha de peso nesta questão).



Texto nº 3 - A versão mais recente do Arqueólogo Gabriel Rocha Pereira


"Embora se desconheça, actualmente, o seu verdadeiro traçado, sabemos efectivamente que passaria em Esmoriz, nas proximidades do Chão do Grilo, onde apareceu em 1931 uma necrópole, visto que, segundo a tradição romana as necrópoles situavam-se ao longo das vias, para que os mortos fossem recordados pelos viajantes. Escavada em 1931 pelo Engenheiro Rui de Serpa Pinto, tendo aparecido 24 sepulturas de inumação em uma saibreira, se bem que, ao que tudo indica o número de sepulturas terá aumentado em anos posteriores (...) Implantadas nas proximidades de um afluente do Rio Maior, esta necrópole encontra-se actualmente soterrada, cerca de 2 metros de profundidade, segundo informações orais (...) o seu paradeiro, bem como o presumível povoado, é-nos desconhecido. A cronologia deste sítio, atendendo à descrição dos materiais encontrados, aponta para um período de transição entre o mundo romano e inícios da Alta Idade Média". 

("Notas para o Estudo da Arqueologia no Concelho de Ovar" - artigo da autoria de Gabriel Rocha Pereira" in Revista Dunas). Aproveitamos ainda para agradecer as indicações valiosas de António França, responsável pela parte do Património do nosso Município.


Conclusão

A Necrópole (isto é, cemitério antigo) de Gondesende afinal ainda existe. Está soterrada. No tempo de Rui Serpa Pinto, estaria a 0, 70 metros de profundidade, hoje estará a 2 metros debaixo do solo. Em termos oficiais, foram encontradas 24 sepulturas, mas tudo indica que o número total seja bem superior. O texto nº 1 (o artigo do Jornal de Notícias) lança a hipótese duma nova escavação que, ao adoptar a tecnologia mais avançada, permitirá reconstituir a configuração bem como as origens exactas deste cemitério bastante antigo que merecia um tratamento mais digno. É património de Esmoriz, talvez até seja a estrutura mais antiga que deveríamos conservar. Pelo que pudemos apurar, e tal como Aires de Amorim (leia-se a sua monografia sobre Esmoriz) e Rui de Serpa Pinto já haviam referido, a necrópole remontaria à época de domínio bárbaro (suevos e visigodos) na Península Ibérica (século V-VIII). Contudo, Gabriel Rocha Pereira lança a hipótese de o mesmo já remontar ao período romano, tendo conhecido um prolongamento após as invasões bárbaras. E há quem ainda fale na eventualidade do referido cemitério ter perdurado até à era da Reconquista Cristã. Fascinante, não é?
Por outro lado, questiona-se a localização da povoação que possuiria então tal necrópole? Será que existia uma comunidade nas proximidades? Em Esmoriz? Paramos? Rio Meão? Cortegaça? Paços de Brandão? Pela proximidade, creio que esta descoberta atesta a existência duma comunidade mais antiga que parece ter caído no esquecimento com a evolução dos tempos. Confesso que estou inclinado a aceitar a existência duma povoação em Esmoriz que teria então uma necrópole no lugar de Gondesende. É óbvio que faltam evidências inegáveis que sustentem esta tese, contudo, a localização exacta do referido cemitério não deixa quaisquer dúvidas... É o nosso património. Faz parte da nossa história. Vamos deixá-lo soterrado?????


Galeria de Imagens (década de 1930)


Em seguida deixamos algumas imagens extraídas da Revista Dunas, promovida pela Câmara Municipal de Ovar. Todas as fotografias apresentadas são da década de 1930, aquando da realização das escavações. Infelizmente, hoje seria praticamente impossível tirar fotos. Para isso, teria que trazer uma pá para começar a escavar e não sei se teria forças para perfurar dois metros de profundidade.
Também deixamos um mapa que indica a localização precisa da necrópole.


Imagem nº 1 - Rua das Saibreiras/ Rua da Estada Nova (Esmoriz). Mas o matagal é enorme! Não se percam, meus caros concidadãos curiosos! ;)
Mapa retirado da Revista Dunas




Imagem nº 2 - As escavações em 1931 com recurso a juntas de bois.
Imagem extraída da Revista Dunas



Imagem nº 3 - Duas imagens sobre a sepultura nº 23. Na primeira, a mesma encontra-se fechada. Na segunda, procedeu-se à sua abertura, embora não se tenham detectado ossadas no seu interior, pois o tempo tratou de reduzir quase tudo a cinzas. Só apenas em uma sepultura, se encontrou restos dum crânio, para além de duas tíbias juntas a outra.
Retirada da Revista Dunas. Fotos e legendas da autoria de Rui de Serpa Pinto


Mas é claro que todo este trabalho magnífico realizado por nós não poderia terminar sem um poema que retratasse a temática em questão e ,por isso, querendo aqui o Cusco de Esmoriz conferir alguma originalidade a este texto, decidiu então deixar a sua inconfundível marca:


A Necrópole que também foi Enterrada
(Poema da autoria do Cusco de Esmoriz)


Em 1931, assegurava-se uma grande descoberta,
A da fascinante Necrópole de Gondesende,
Que colocou o povo de boca-aberta,
Perante inacreditável presente!


Encontradas 24 sepulturas,
Do tempo das invasões germânicas,
O Entusiasmo acompanhou as suas aberturas,
Procurando compreender as suas dinâmicas.


Actualmente, esta estrutura patrimonial,
foi abandonada e engolida pela terra,
Porque o ser humano nem sempre é intelectual,
Culminando neste triste capítulo que, agora, se encerra!

Restam-nos os abençoados apontamentos,
De quem viveu as ocorrências,
Pois hoje nos deparamos com impedimentos,
Apesar das infrutuosas persistências.

5 comentários:

  1. Olá
    Mais um excelente artigo que, quanto a mim, abre as portas a um trabalho de Investigação/Tese...
    Haja quem «deite mão à obra»; o «achado» merece-o.
    Cumprs
    Augusto

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  2. Olá, eu sou o lider de uma equipa de investigação do paranormal de seu nome Team Anormal. Gostávamos de fazer uma investigação no local mas será que nos podem facultar mais informações como local exato e se a terreno tem dono ou até mesmo se o local está sob a alçada de alguma entidade do governo? Escrevam para: teamanormal@gmail.com Obrigado

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    1. Rua da Saibreira (Esmoriz) perto da empresa Cordex e da Estrada Nova. O espaço fica num matagal enorme e não sei se é fácil de identificá-lo à primeira vista.

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    2. Olá Cusco
      Viu as fotos que lhe enviei há já algum tempo com imagens dos achados desta Necrópole?
      Cumprs
      Augusto

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