Intervenção do Grupo Municipal do Bloco de Esquerda
“Sessão Extraordinária” 24/01/2019
2.2 – Transferência de Competências para os Órgãos Municipais e das Entidades Intermunicipais – discussão e votação
Nesta fase de prenuncia da Assembleia Municipal relativa a uma parte dos diplomas já publicados no âmbito da Lei 50/2018, sobre a Transferência de Competências para os órgãos municipais e das entidades intermunicipais, gostaríamos de começar por registar a posição do Município de Ovar em aderir a um processo, mesmo com as condicionantes expostas pelo senhor Presidente, sobre áreas já acompanhadas pelo Municipio. Ao contrário da descentralização de competências ou de qualquer aprofundamento da autonomia do Poder Local para garantir melhoria da qualidade dos serviços públicos, o que há aqui na essência desta Lei, é uma oportunidade há muito ambicionada por pseudo empreendedores, que espreitam o momento para colocarem ao serviço de interesses privados, serviços públicos. Experiencias de algumas práticas autárquicas, que assim, igualmente se desresponsabilizam das competências que lhes vêm sendo atribuídas pelo Poder Central, que agora, através de um acordo a nível da Assembleia da República entre os partidos da alternância governativa, PS e PSD, se propõem, não a uma efetiva descentralização democrática da administração pública, mas, inclusivamente a transferir competências para entidades que não são eleitas pelos munícipes, como neste caso, a Comunidade Intermunicipal CIRA. Uma entidade intermunicipal sem órgãos eleitos por sufrágio direto pelos cidadãos, mas sim composta por representantes nomeados pelas autarquias e dominadas por um elevado bipartidarismo que não reflete a diversidade politica da sociedade.
Já na sessão da Assembleia Municipal de 28 de setembro de 2018 o Bloco de Esquerda foi um dos partidos que através de uma recomendação, manifestou oposição a estas transferências de competências em 2019, exatamente por considerar que esta Lei 50/2018 viola vários princípios consagrados na Constituição, nomeadamente o princípio da subsidiariedade, igualdade, universalidade e o estado de direito democrático. E ainda que se reconheça, que há competências, que pela proximidade ao território, estarão melhor entregues às autarquias locais. Há no entanto competências, também na mira de transferências, como a saúde ou a educação, que são melhor asseguradas pela Administração Central ou por entidades regionais democraticamente eleitas, como seria a regionalização que os poderes centralistas continuam a negar às populações, em nome do que chamam de descentralização, quando não passa de um processo de concentração no Poder Local dependente das garantias financeiras das respetivas transferências, que são aliás razão, para muitos municípios ainda não terem cedido a esta pressão e tentação de mais poder e influencia.
Reafirmamos assim, que, este processo não é claro, e curiosamente, o documento “parecer” deste ponto em discussão, assinado pelo senhor Vice-presidente da Camara Municipal de Ovar, também reconhece, e cito, “os procedimentos legislativos subsequentes, nomeadamente os Decretos-lei sectoriais já publicados, carecem de maior clareza, sobretudo nos instrumentos e formas de contratualização a efetivar entre o Estado e a Administração Local, e bem assim na perfeita assunção da afetação de meios e recursos necessários, não só os financeiros (…)”.
Esta falta de clareza num processo demasiado apressado, só por si deveria ser motivo de reconsideração do executivo municipal e desta Assembleia Municipal, porque não se pode aceitar que depois, as autarquias locais venham invocar insuficiência de meios humanos ou de recursos técnicos, para concretizar as novas competências através da sua concessão a entidades privadas, pondo em causa o acesso universal pelas populações ou até facilitando a degradação do serviço público. Aliás, como tem sido noticiado há mais de 40 autarquias de norte a sul que rejeitaram oficialmente assumir estas novas competências do estado central em 2019, e ainda que o entendimento entre no PS e o PSD conduza a que este processo seja uma realidade em 2021, é caso para perguntar. Qual é a pressa?
É pois perante estas considerações, que insistimos na oposição a este processo, porque nos termos da Constituição, a descentralização administrativa deve visar, entre outros objetivos, o reforço da coesão territorial e social, ou seja, deve traduzir-se numa justa repartição de poderes entre o Estado e as autarquias locais para assegurar melhores politicas públicas para resolução dos problemas das pessoas e dos territórios, que implicam transferências de competências para as autarquias locais, acompanhadas dos adequados meios humanos, patrimoniais e financeiros. Meios que não são garantidos nesta Lei 50/2018, que no nosso ponto de vista, também não é uma reforma do Estado que conduza a um aprofundamento da autonomia do Poder Local. Por isso, e ao contrário do documento “parecer” do Município, não vislumbramos por parte do Poder Central, neste processo de descentralização de competências, qualquer promoção de coesão territorial ou reforço da solidariedade inter-regional, para a necessária melhoria da qualidade dos serviços prestados às populações.
Assim, não acompanhamos as disponibilidades da Câmara Municipal de Ovar para, nesta fase dos Diplomas setoriais, viabilizar desde já o caminho que abre portas a um processo pouco claro e sobretudo, que dá poderes a uma entidade não eleita por sufrágio direto como é a CIRA.
Deputado do BE na Assembleia Municipal de Ovar
José Lopes