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quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Entrevistas com Memória IV


Ginásio C. Esmoriz é Bicampeão Nacional de Voleibol
Esmoriz continua na Europa

De há três épocas a esta data o voleibol de Ginásio tornou-se o principal embaixador de Esmoriz parecendo, ano após ano, querer reforçar um direito do qual teima já em não abdicar. Após a conquista da Taça de Portugal na época 81/82, o valoroso “seis” rubro-branco conquistou no ano transacto o seu primeiro título nacional, acabando também por ser finalista da Taça, prova que, tal como o campeonato, coloca o visto no passaporte, via Europa.
Continuando um bom trabalho sob a orientação de José Moreira, aí temos o já temível Ginásio a bisar este ano o título maior nacional e com boas perspectivas de chegar de novo à final da Taça. 
Se um título é já um feito de que muita boa gente não se pode orgulhar, o facto de ele ser conseguido sem que, na sua derradeira fase seja conhecido o sabor amargo da derrota, fica sem dúvida com outro colorido, afastando para bem longe qualquer veleidade de contestação.
Se ao palmarés referido juntarmos o campeonato regional na época 82/83, isto em seniores porque o Ginásio não é só isto, já que desde as escolas, passando pelos iniciados e juvenis ali militam mais de uma centena de atletas, cabendo aqui referir que as juvenis femininas acabam de se sagrar campeãs nacionais, poderemos afirmar que em Esmoriz se está a formar uma pequena constelação no universo do voleibol.
Será tudo isto entretanto um mar de rosas? Certamente que não. Uma equipa de província por   muito modesta que seja tem os seus problemas, agravados como é evidente à medida que se vão subindo os degraus do sucesso.
O Ginásio não foge à regra e apesar do calor que os amantes da modalidade e amigos da sua terra oferecem aos seus valorosos atletas quando dentro do pequeno rectângulo defendem com galhardia as cores da camisola que encharcam com o seu suor, muitos problemas existem que urge ultrapassar e só uma exemplar dedicação consegue vencer.


Entrevista de M. Alberto

Num clube sem fronteiras praticando o amadorismo quase a cem por cento em que os familiares dos atletas lavam e tratam os próprios equipamentos, muito haveria para dizer e que certamente encheria páginas sem conta.
Debruçar-nos-emos, entretanto, no que julgamos ser os problemas mais prementes. Para isso, procurámos Américo Gomes, um presidente de antes quebrar que torcer. Desde a primeira hora vivendo e sentindo os problemas do seu Ginásio, é agora um timoneiro que, qual valente capitão, será o último a abandonar o barco.
Da conversa que durante largos minutos mantivemos, registamos o seguinte:


VE – O Ginásio aparece nos últimos três anos no primeiro plano do Vólei Nacional e foi já à Europa. A que se deve isto?

AG- Deve-se a uma opção de altura de jogadores pois o Esmoriz Ginásio Clube de há longos anos vinha a conseguir conquistar todos os títulos nacionais, com a excepção dos seniores masculinos. Os jogadores tinham técnica apurada mas chegavam à categoria de seniores e notava-se grande diferença na sua altura em relação aos adversários o que como é evidente se reflectia negativamente. De há alguns anos a esta data começou a fazer-se uma selecção nas alturas, isto sem esquecer o tecnicismo dos mais baixos. Paralelamente, fez-se igualmente uma opção de ataque e os resultados estão à vista. De opção em opção com a passagem de alguns brasileiros pelo nosso “seis” conseguimos finalmente os serviços do José Moreira, sem dúvida o melhor técnico nacional, e a abertura das fronteiras com idas à Jugoslávia e à Turquia primeiro na Taça das Taças e depois na Taça dos Clubes Campeões Europeus. Este ano vencemos tudo e todos [no panorama interno] inclusive escandalosas jogadas de alguns dirigentes adversários.



VE – Pelo que sabemos a actual classe do Esmoriz Ginásio Clube deve-se às escolhas da colectividade, estas vão continuar?

AG- Esse foi um dos problemas com que me deparei. Os anteriores executivos sem que as desprezassem, não lhes deram a devida atenção e a certa altura começou a notar-se a falta de recursos. Então no início da época fizemos um levantamento a nível de minis, iniciados e juvenis, estando de novo assentes as bases para que as classes inferiores possam oferecer aos seniores a necessária sucessão.




VE – Apesar do amadorismo da equipa, grandes encargos financeiros existem com certeza, como é que a Direcção os resolve? Sente-se apoiada nesse sentido?

AG- O Esmoriz Ginásio Clube tem efectivamente um profissional que é o treinador e mesmo assim não ganhando de acordo com a sua categoria, embora muita gente assim não pense. Para além deste, apenas a outro é concedido um subsídio de deslocação, sendo todos os outros puros amadores. Contudo, os custos existem e são bastante elevados. A prová-lo teremos as contas que encerrarão este ano com cerca de 3.000 contos de despesas. Se perguntarem de onde vem o dinheiro poderei dizer que 250 contos são provenientes de quotas, 500 de publicidade, mais alguns subsídios, nomeadamente para deslocações ao estrangeiro, que nos deixam entretanto a meio do caminho. O restante. O restante resulta da realização de sorteios e do recurso a amigos não só do Esmoriz como de fora.



VE – O actual pavilhão não resolve já os problemas do Ginásio. Está já lançada a primeira pedra para um novo complexo desportivo? Para quando o seu início?

AG – Posso adiantar-lhe que está já a concurso o Pavilhão que Esmoriz precisa e de que há muito se fala. O que agora vai ser preciso é não esquecer que sem trabalho nada se fará e o trabalho é de todos. Esperamos que, na pior das hipóteses, no fim do mês de Julho as obras possam ser iniciadas. Entretanto para aqueles que continuam a duvidar que o pavilhão será uma realidade, poderei desde já adiantar mais alguns ambiciosos empreendimentos. A piscina olímpica, oito courts de ténis e um parque recreativo infantil.



VE – A experiência europeia?

AG – A experiência europeia deve ser falada apenas para não nos esquecermos dela. Existe uma diferença abismal entre o nosso vólei e o lá de fora. Por alguma razão, o nosso país se queda nos últimos lugares quando se defronta com equipas estrangeiras. A propósito gostaria de referir que enquanto a estrutura do nosso Vólei não for alterada, nada se conseguirá. Enquanto se continuar a permitir que centenas de contos continuem a ser gastos com deslocações de equipas nacionais ao estrangeiro sem qualquer resultado prático ao contrário do investimento na chamada até cá de técnicos estrangeiros para fazerem um trabalho de base, nada se conseguirá. No meu entender, só assim se conseguirá um nível que nos permitiria enfrentar condignamente o Vólei de além-fronteiras. Nessa altura sim, seria de acarinhar e gastar tudo o que seria de gastar porque estaríamos em pé de igualdade. Neste momento, são aventuras que aparecem e que os clubes não hesitam em dar como prémio aos seus jogadores.



VE – Quer dizer que apesar de tudo o Ginásio irá à Europa?

AG- Enquanto eu for presidente, o Ginásio cumprirá todos os calendários.



VE – Quando acaba o seu mandato?

AG – No fim da presente temporada. Nessa altura espero que na Assembleia Geral apareça não só quem acarinhe o vólei como também quem possa garantir uma sucessão directiva na certeza de que me terão sempre ao seu lado, sem quaisquer condicionalismos. 



VE – Não quer isto dizer que tenha já esgotado o que tem para dar ao Ginásio?

AG- Certamente que não e porque sou teimoso não permitirei que se caia numa expectativa do que será o Ginásio quando esta ou aquela Direcção abandonar o barco. 



VE – Gostaria de acrescentar algo?

AG- Não desperdiçarei esta oportunidade para alertar a população de Esmoriz para o facto de o Ginásio ser o principal embaixador da sua terra e, como tal, tem de ser acarinhado. Sem apoio, sem dedicação, nada conseguiremos.



Embora tocados ao de leve ficámos a saber muito dos problemas do Ginásio, do seu passado, do seu presente e ainda o mais importante, do que pensam os seus dirigentes do que poderá vir a ser o seu futuro. 
Porque tínhamos presente o técnico José Moreira, não quisemos deixar passar a oportunidade de lhe perguntar o porquê da sua opção por Esmoriz. Ele respondeu: “Não se trata verdadeiramente de uma opção mas sim da ausência a um convite que me foi feito quando abandonei o Futebol Clube do Porto, com intenção de abandonar definitivamente a modalidade. Porque gosto do vólei, aqui estou.” 
Interrogado ainda acerca do seu trabalho de base, afirmaria: “Trabalho de base propriamente não se poderá assim dizer. Para isso, teria de começar com as classes inferiores o que não aconteceu. Se atendermos, no entanto, à preparação de uma equipa sénior para em três ou quatro anos poder atingir determinado nível, posso dizer que efectivamente da experiência estão a ser colhidos frutos que penso serem bons”. 





Imagem nº 1 - Américo Gomes, Presidente do Esmoriz Ginásio Clube dos inícios dourados da década de 80.
Direitos da Foto - Jornal A Voz de Esmoriz, 1984





Imagem nº 2 - A equipa maravilha responsável pela celebração do bicampeonato na época de 1983/1984.
Direitos da Foto - Jornal A Voz de Esmoriz, 1984



Abreviaturas - VE (Voz de Esmoriz) e AG (Américo Gomes, Presidente do Esmoriz Ginásio Clube).


Reportagem/Entrevista retirada do Jornal A Voz de Esmoriz. Edição de 15 de Junho de 1984. Nº 501. Dir. Manuel António Silva. Comissão de Melhoramentos de Esmoriz, Esmoriz. 

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