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sábado, 15 de junho de 2019

Entrevistas com Memória VIII


A nossa convidada especial do mês de Junho para uma entrevista é Jacinta Valente. A coordenadora técnica do Centro Comunitário de Esmoriz vai-nos falar um pouco da expressão associativa e social da entidade.  


1– Boa tarde, Jacinta. Como nasceu o projecto do Centro Comunitário de Esmoriz?

Jacinta Valente: O Centro Comunitário de Esmoriz foi fundado a 21 de Novembro do ano 2000 na sequência do término de um Projecto de Luta Contra a Pobreza, promovido pelo Município, nos Bairros Piscatórios de Esmoriz e Cortegaça. A Comissão Instaladora derivou de elementos dos Órgãos Sociais do Esmoriz Ginásio Clube, parceiro do Projecto, e o objectivo principal foi dar continuidade e ampliar o trabalho de intervenção comunitária nas Freguesias de Esmoriz e Cortegaça e, progressivamente, em outras freguesias do Concelho de Ovar.



2 – Na época em que a IPSS nasceu, vislumbrava a cidade e o concelho com várias vulnerabilidades sociais? De que natureza?

Jacinta Valente: As problemáticas sociais não variam muito, o que varia é a sua prevalência e visibilidade. O Projecto de Luta Contra a Pobreza veio trazer ao conhecimento da comunidade problemas sociais graves, especificamente: a pobreza e exclusão social, habitação degradada (barracas, construções abarracadas), desemprego, emprego precário e sazonal, a diminuta oferta de espaços para ocupação de tempos livres das crianças e jovens, absentismo e abandono escolar, desconhecimento dos direitos e deveres sociais, fraco exercício de cidadania e de participação comunitária. O primeiro trabalho que desenvolvemos no Projecto de Luta Contra a Pobreza em 1998 foi conhecer cada pessoa e cada família da comunidade, andámos 1 ano no terreno a desenvolver esse estudo que nos permitiu aferir um diagnóstico e um plano de intervenção social local, o qual foi editado no livro: "O Arrais da Vida: Galgar os Limites do Quotidiano".



3- Após quase duas décadas de existência, quais foram os grandes resultados do Centro Comunitário de Esmoriz perante a sociedade? Poderá apontar uma estimativa do número de pessoas ajudadas no âmbito dos vossos projectos?

Jacinta Valente: O Centro Comunitário de Esmoriz nasceu de um Projeto, por isso herdou toda a metodologia de trabalho assente numa rede de parceiros e na rentabilização dos recursos da comunidade e em prol do desenvolvimento social local. O trabalho na comunidade assente na proximidade e com os parceiros é, realmente, um ganho e uma marca da nossa identidade.

Saliento também a conquista da confiança e reconhecimento das entidades que nos tutelam e das outras entidades locais. Sem falsas modéstias, acho que somos uma referência distrital, e não só, e a nossa comunidade deve orgulhar-se disso.

A aprovação e desenvolvimento de inúmeros projectos inovadores em áreas a descoberto no concelho.

A abrangência dos nossos serviços, neste momento temos 5 serviços e projectos de âmbito concelhio e 2 direccionados apenas para as freguesias de Esmoriz e Cortegaça.

O número de utentes que temos: acompanhamos aproximadamente 860 famílias em todo o concelho no âmbito do Atendimento e Acompanhamento Social. No conjunto dos diferentes serviços e projectos acompanhamos cerca de 3500 pessoas.

A especialização, qualificação, competência, jovialidade e motivação da nossa equipa de colaboradores.

No entanto, os resultados no trabalho social são muito difíceis de medir, aliás essa é uma grande ambição que temos … conseguir medir o impacto do nosso trabalho na comunidade. Fazer perceber, quanto vale cada euro que é investido em nós.



4- Quais foram as melhores iniciativas desenvolvidas pelo Centro Comunitário de Esmoriz?

Jacinta ValenteOs Programas educativos que desenvolvemos em meio escolar: 
Programa de Educação Sexual para o 1º Ciclo “À Descoberta com Zé e a Maria”, que temos dinamizado todos os anos nos 4º anos das 9 EB1 do Agrupamento de Escolas Ovar Norte, durante 15 sessões.
EMOJI – O Detective de Emoções, programa de educação emocional, que temos dinamizado nas Pré-escolas do Agrupamento de Escolas Ovar Norte, com 8 sessões;
Cândido – O Aumentador de Asas, programa de promoção da cidadania e voluntariado, que temos dinamizado também nas Pré-escolas de Agrupamento de Escolas Ovar Norte.
- As Oficinas Ocupacionais para Adultos: Restauro, Informática, Yoga, Costura, Artes Plásticas.
- A qualificação, promoção do voluntariado com a dinamização de programas de voluntariado: colaboram, com uma regularidade semanal, nas actividades do CCE 11 voluntários e, pontualmente, cerca de mais 30.
- A Loja Solidária, que tem permitido recuperar bens, desde vestuário, móveis, electrodomésticos, que já não servem para alguns e colocá-los ao serviço de outros
- A Caminhada Coração Solidário que já vai na sua 17ª edição.
- A comemoração dos 15 anos do CCE: Foi um momento irrepetível concebido e realizado pelos colaboradores e utentes e no fundo que, para além, dos 15 anos, comemorámos também a nossa recuperação depois de um período crítico;
- 30 Horas a Pedalar por um Sorriso: Evento onde angariámos 3.000€ para pagamento de tratamentos dentários aos nossos utentes
- Família em Festa: Um evento que realizamos anualmente em Setembro, no Parque Ambiental do Buçaquinho, destinado às famílias.
- A nossa participação nas Mostras Sociais do Concelho, têm sido marcadas pela diferença na nossa representação;
- Os Seminários que realizámos em 2018: “Um Olhar sobre Mim, na relação com os Outros” e o “Às Voltas com as Dependências”
- As Matinés Dançantes para os Séniores, da nossa iniciativa, mas desenvolvidas em conjunto com mais 7 Instituições do Concelho, alternadamente uma vez por mês, num verdadeiro trabalho em rede.
- O nosso teatro-fórum, uma metodologia diferente de trabalhar a sensibilização para as dependências em meio escolar.


5– E os momentos bons ou críticos, quando foram vividos? E porquê?

Jacinta ValenteDe todos os momentos bons que são efectivamente muitos, saliento aqueles em que os nossos utentes conseguem mudar de vida… esses são realmente os melhores e os que nos fazem continuar, num trabalho em que é preciso ter uma grande humanidade e, em simultâneo, uma grande resistência emocional e persistência.
Depois:
É tudo tão difícil de obter, quando conseguimos concretizar um novo projecto ou uma nova resposta social é uma alegria muito grande.
Apreciamos também muito os momentos em que as várias equipas do CCE se envolvem num objectivo comum, por exemplo num evento, porque temos pessoas muito talentosas e potenciamo-nos uns aos outros e divertimo-nos muito também.
Os momentos mais difíceis foram aqueles que decorreram entre os anos de 2011 e 2013 em que, por dificuldades financeiras, estivemos numa situação de quase encerramento.



6- Além do apoio aos mais carenciados, a entidade dispõe de acções de formação profissional? Que tipo de disciplinas ou temáticas são leccionadas?

Jacinta ValenteO CCE já promoveu muitas acções de formação no passado. No momento, não desenvolvemos formação padronizada. O que desenvolvemos são, sobretudo, acções de capacitação: de competências pessoais, sociais, parentais, bem como acções de alfabetização e português para estrangeiros e informática. Por exemplo, recentemente o nosso Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Parental, dinamizou um workshop, constituído por 3 sessões, para os pais das crianças que frequentam o Centro Social Cortegacense e foi muito compensador para todos.



7- E a loja solidária? Como e onde funciona? Tem merecido afluência?

Jacinta ValenteA Loja Solidária surgiu numa altura de grandes dificuldades da Instituição. Face a muitas dádivas em géneros que não tínhamos como escoar, decidimos devolver à comunidade esses produtos, de duas formas: gratuitamente, a utentes com carência económica e a troco de pequenos donativos para a população em geral. Os donativos angariados revertem para apoiar a dinamização de atividades do CCE e apoios económicos aos utentes em situação de carência.
Sim, temos uma grande afluência à Loja Solidária quer de pessoas a oferecer artigos quer pessoas a procurar artigos.
O lema da loja é “Muito mais do que dar e receber: Recolhemos, Dignificamos, Ajudamos”… é isto resumidamente. A mesma situa-se na Avenida Joaquim Oliveira e Silva, no lugar da Praia de Esmoriz.



8– O Centro Comunitário de Esmoriz tem combatido as dependências (álcool, drogas, prostituição…) e foi notícia nacional por causa do projecto – "Dá a Volta". Explique em que consiste tal estratégia.

Jacinta ValenteEstrategicamente o CCE tem uma linha definida das áreas, projectos e respostas sociais que pretende desenvolver. A área dos comportamentos aditivos e dependências sempre esteve nos nossos objectivos. Começámos por intervir ao nível da Redução de Riscos e Minimização de Danos com o Projecto Dá a Volta, depois conseguimos ganhar o projecto na área da Reinserção com o IntegraOvar e mais recentemente na área da Prevenção com o Abispa-te. O Dá a Volta consiste numa equipa de rua que realiza giros diários pelas ruas do concelho de Ovar, prestando apoio aos consumidores e trabalhadores sexuais, numa perspectiva de saúde pública (educação para a saúde, cuidados de enfermagem, distribuição de material, distribuição de medicação, apoio psicossocial, distribuição de vestuário e snacks, acompanhamentos a serviços). Não existimos para julgar ninguém nem persuadir a assumir um percurso de vida diferente, intervimos para que os utentes tenham práticas mais seguras para eles próprios e para a comunidade. É óbvio que na relação de confiança e proximidade que estabelecemos, muitas vezes podemos proporcionar condições de vida mais humanizadas, e não raras vezes, apoiar a mudança de vida. 



9- Quais as metas e os desafios do Centro Comunitário de Esmoriz no futuro?

Jacinta ValentePrecisamos de instalações para crescer e poder desenvolver outro tipo de respostas necessárias à comunidade. A Segurança Social exige a existência de instalações devidamente ajustadas e licenciadas para poder estabelecer protocolos e isso trava o desenvolvimento da Instituição.



10- Como sente o reconhecimento social do trabalho até então desenvolvido?

Jacinta ValenteNão é fácil responder a essa questão… talvez há de tudo seja a melhor resposta… sabemos que temos a confiança dos nossos principais financiadores e parceiros – Segurança Social e SICAD - Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e Dependências do Ministério da Saúde – bem como da autarquia local. Acho que a maioria da população reconhece os ganhos da intervenção do CCE para a comunidade, mas existem sempre os que discordam da nossa intervenção. Mas acho que somos uma Instituição forte, cujos Colaboradores gostam do seu trabalho e têm orgulho em pertencer a esta organização e tudo fazem para a honrar e fazer crescer… e acho que isso se sente. É uma Instituição que aposta também na dinamização de programas de voluntariado e os voluntários são também uma grande força da Instituição.


Muito obrigado pela disponibilidade em responder às dez perguntas que elaboramos nesta entrevista.





Imagem nº 1 - Jacinta Valente, coordenadora do Centro Comunitário de Esmoriz, junto do técnico Nuno Rechena, técnico da IPSS. Manuel Monteiro é actualmente o presidente da instituição.
Direitos da Foto - Centro Comunitário de Esmoriz





Imagem nº 2 - A Caminhada Coração Solidário é uma iniciativa do Centro Comunitário de Esmoriz que já conta com 17 edições e visa a angariação de produtos alimentares que reverterão para as famílias mais carenciadas.
Direitos da Foto - Centro Comunitário de Esmoriz

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