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sexta-feira, 30 de maio de 2014

Reportagem Cultural I - "Florbela Espanca e Esmoriz"



1 - Florbela Espanca e a "aldeia" de Esmoriz


Florbela Espanca (1894-1930) foi uma das personalidades mais marcantes da História da nossa Literatura. Poetisa de exímia qualidade, esta alentejana de nascimento (Vila Viçosa), passou dois anos da sua vida nesta terra à beira-mar que se pautava pela prática da tanoaria e da arte xávega. 
Por volta do ano de 1925, terá passado efectivamente por Esmoriz. Discutem-se ainda as datas da sua permanência na terra barrinhota, mas avançam algumas fontes que aqui ficou por dois anos. Reservada e pouco dada com o exterior, houve ainda quem julgasse que a sua passagem pela nossa terra teria sido muito mais efémera, resumindo-se a uma curtíssima estadia. A sua moradia estaria situada no lugar da Casela, actualmente muito perto das duas principais escolas da cidade, e possuía ainda uma propriedade no lugar da Estrada Nova. 
Não sabemos se Esmoriz lhe deu inspiração suficiente para redigir novos poemas que viriam a ser mais tarde publicados. Queremos acreditar que sim! Até porque dois anos sem escrever um poema, não é típico dum poeta/poetisa tão produtiva como Florbela Espanca efectivamente o foi.
Deverá ainda ter realizado traduções, tarefa que igualmente desempenhou no decurso da sua vida. Redigiu igualmente contos.





Imagem nº 1 - A casa, no lugar da Casela, que fora habitada por Florbela Espanca que na altura tinha conhecido o seu terceiro marido - o médico Mário Lage.





Imagem nº 2 - A actual moradia no lugar da Casela localiza-se perto da Escola que em Esmoriz seria consagrada em seu nome.



Posteriormente, viveria na casa dos pais de Mário Lage em Matosinhos, despedindo-se definitivamente desta aldeia (Esmoriz só seria vila em 1955, e cidade em 1993) que a acolheu durante um biénio. Em 1930, faleceria naquela localidade do Norte do País, sendo sepultada em Sendim. Mais tarde, o seu túmulo foi trasladado para o cemitério de Vila Viçosa, sua terra natal.






Imagem nº 3 - A sepultura de Florbela Espanca no Cemitério de Vila Viçosa, depois dos seus restos mortais terem sido trasladados a partir de Sendim - Matosinhos.
Aí se pode ler: 



Certo é que esta autora de classe deixou-nos várias obras de poesia: "Livro de Mágoas" (1919), "Livro de Soror Saudade" (1923), "Charneca em Flor" (edição póstuma - 1931), e de contos - "Dominó Preto" (escrito em 1927) e "Máscara do Destino" (edição póstuma - 1931). Algumas destas obras são posteriores à sua estadia em Esmoriz, o que vem reforçar a ideia de que a preparação ou a idealização das mesmas poderá ter acontecido a partir da sua presença na nossa terra.
Em termos de temáticas versadas, esta mulher, totalmente livre de preconceitos, abordou: a dor, a saudade, a ansiedade, a solidão (que terá seguramente vivido ao longo da vida, como se sucedeu igualmente em Esmoriz), o desespero, o amor, o erotismo, o regresso ao nada, a morte... Dedicou ainda muita atenção ao Alentejo (de onde era natural), recordando a sua planície. 
Muitos dos seus temas eram nostálgicos e melancólicos. Por isso, ainda existe a desconfiança de que teria cometido suicídio em 1930, após algumas tentativas fracassadas.
Certo é que deixou um legado enriquecedor à Literatura Portuguesa, e o seu impacto foi de tal forma enorme, que qualquer português, de Norte a Sul do País, sabe quem ela foi ou, pelo menos, já ouviu falar do seu nome. E atenção esta fama, ela não a conseguiu a dar uns toques numa bola ou a realizar discursos demagogos na política, mas sim na nobre arte da poesia, que neste país, foi sempre um sector bastante subvalorizado. 
Florbela foi, pois, um génio, e a sua obra hoje é leccionada nas escolas e contribui para que os jovens se consigam inteirar das luzes da nossa cultura nacional.





Imagem nº 4 - Florbela Espanca brilhou no sector da cultura e foi aí que atingiu os píncaros. 




2- Como Florbela é vista em Esmoriz...


Certamente existem pessoas, nomeadamente professores e outros cidadãos mais bem informados, que têm conhecimento da sua breve passagem por Esmoriz. Mas denoto igualmente que muitos, embora conhecendo a fama desta poetisa, não estavam a par desta realidade. E daí termos elaborado este artigo, de forma a tornar ainda mais público este facto. 
É verdade que a terra não se esqueceu da sua artista, e consagrou através dela o nome do actual agrupamento de escolas, localizado praticamente muito perto da sua antiga casa.
Mas sinceramente, creio que ainda não é suficiente. É necessário fazer passar a mensagem aos esmorizenses e a quem nos visita, de que Florbela Espanca passou por cá, sim, aquela ilustre senhora - uma das melhores poetisas a nível mundial, atrevo-me eu a dizer! Ela é conhecida nos quatro cantos do Mundo - Portugal, Brasil, Espanha, África Portuguesa...
Como se poderá então divulgar o seu prestígio e associá-lo igualmente à nossa terra:

  1. Reabilitar a sua antiga casa da Casela e sinalizá-la com uma lápide exterior que mencione - "Aqui viveu Florbela Espanca, célebre poetisa portuguesa, por volta do ano de 1925", de forma a que quem passe por ali, conclua que aquela humilde propriedade não se pauta afinal pela vulgaridade monótona pois a mesma já foi habitada por um dos ícones da nossa nação. Claro que o proprietário privado da habitação e a Junta de Freguesia de Esmoriz têm uma palavra a dizer quanto a isso, e esperemos que possam chegar a um entendimento harmonioso (esperando que as vontades de ambas as partes sejam respeitadas). Bastaria colocar uma pequena lápide de mármore na parede frontal e que diferença faria em termos informativos para elucidar os mais desatentos.
  2. Instituir o dia de Florbela Espanca em Esmoriz. Poderia sugerir o dia 8 de Dezembro (já que ela nasceu nesse dia) mas a data poderá ser sempre discutível. E o que é que se faria nesse dia? Convidavam-se várias turmas escolares (aquelas que estivessem interessadas) a apresentar, no auditório da Junta de Freguesia, os trabalhos que tivessem realizado sobre conceituados autores portugueses do passado. Claro que, nesse lugar, em simultâneo, deveria decorrer uma pequena exposição cultural (com pequenos painéis, textos, melhores poemas e fotografias antigas) sobre a vida e obra de Florbela Espanca. 
  3. Construir uma pequena estátua ou busto em honra da poetisa perto do centro da cidade. Seria um projecto mais ambicioso e custoso, mas decerto que com algumas parcerias, seria possível tornar esta realidade possível. Vila Viçosa e Matosinhos já garantiram este passo...
  4. O comboio turístico, caso avance, poderia passar pela rua junto à sua antiga casa. Revelando assim aos turistas este nosso especial cartão de visita.




Imagem nº 5 - Busto de Florbela Espanca, à frente das muralhas e do Castelo de Vila Viçosa.
Retirada de: https://www.flickr.com/photos/vitor107/3833519502/, (foto de Vítor Oliveira).




Imagem nº 6 - Escultura de homenagem a Florbela Espanca em Matosinhos da autoria de Irene Vilar. 
Pode ler-se:
"QUEM NOS DEU ASAS PARA ANDAR DE RASTOS?
QUEM NOS DEU OLHOS PARA VER OS ASTROS
- SEM NOS DAR BRAÇOS PARA OS ALCANÇAR?
FLORBELA ESPANCA"
Retirada de: 




Imagem nº 7 - Pequena e interessante escultura inaugurada em 2010 no Agrupamento de Escolas de Esmoriz, feita pelo Atelier de Escultura (Grupo de estágio de Educação Visual 2009/2010).





Imagem nº 8 - Na mesma escola, um painel de azulejos em memória da escritora da autoria do 
Grupo de Educação Visual/Núcleo de Estágio (ano lectivo 2010/2011). 


Tem sido a Escola, que herdou o seu nome, a mais empenhada em preservar e defender o seu legado, mas é necessário que o nome de Florbela mereça uma maior divulgação pela cidade, não podendo cingir-se essa missão apenas a uma entidade escolar. 



3 - Alguns dos poemas mais famosos de Florbela Espanca





1- A maior Tortura


Na vida, para mim, não há deleite.
Ando a chorar convulsa noite e dia ...
E não tenho uma sombra fugidia
Onde poise a cabeça, onde me deite !

E nem flor de lilás tenho que enfeite
A minha atroz, imensa nostalgia ! ...
A minha pobre Mãe tão branca e fria
Deu-me a beber a Mágoa no seu leite !

Poeta, eu sou um cardo desprezado,
A urze que se pisa sob os pés.
Sou, como tu, um riso desgraçado !

Mas a minha tortura inda é maior:
Não ser poeta assim como tu és
Para gritar num verso a minha Dor ! ...



2- Amar


Amar!Eu quero amar, amar perdidamente! 
Amar só por amar: Aqui... além... 
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente... 
Amar! Amar! E não amar ninguém! 

Recordar? Esquecer? Indiferente!... 
Prender ou desprender? É mal? É bem? 
Quem disser que se pode amar alguém 
Durante a vida inteira é porque mente! 

Há uma Primavera em cada vida: 
É preciso cantá-la assim florida, 
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar! 

E se um dia hei de ser pó, cinza e nada 
Que seja a minha noite uma alvorada, 
Que me saiba perder... pra me encontrar...




3- De Joelhos“Bendita seja a Mãe que te gerou.” 


Bendito o leite que te fez crescer 
Bendito o berço aonde te embalou 
A tua ama, pra te adormecer! 

Bendita essa canção que acalentou 
Da tua vida o doce alvorecer ... 
Bendita seja a Lua, que inundou 
De luz, a Terra, só para te ver ... 

Benditos sejam todos que te amarem, 
As que em volta de ti ajoelharem 
Numa grande paixão fervente e louca! 

E se mais que eu, um dia, te quiser 
Alguém, bendita seja essa Mulher, 
Bendito seja o beijo dessa boca!! 



4 - Falo de ti às pedras das estradas


Falo de ti às pedras das estradas, 
E ao sol que e louro como o teu olhar, 
Falo ao rio, que desdobra a faiscar, 
Vestidos de princesas e de fadas; 

Falo às gaivotas de asas desdobradas, 
Lembrando lenços brancos a acenar, 
E aos mastros que apunhalam o luar 
Na solidão das noites consteladas; 

Digo os anseios, os sonhos, os desejos 
Donde a tua alma, tonta de vitória, 
Levanta ao céu a torre dos meus beijos! 

E os meus gritos de amor, cruzando o espaço, 
Sobre os brocados fúlgidos da glória, 
São astros que me tombam do regaço! 



5 - Ser Poeta


Ser Poeta é ser mais alto, é ser maior 
Do que os homens! Morder como quem beija! 
É ser mendigo e dar como quem seja 
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor! 

É ter de mil desejos o esplendor 
E não saber sequer que se deseja! 
É ter cá dentro um astro que flameja, 
É ter garras e asas de condor! 

É ter fome, é ter sede de Infinito! 
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim... 
É condensar o mundo num só grito! 

E é amar-te, assim, perdidamente... 
É seres alma e sangue e vida em mim 
E dizê-lo cantando a toda gente! 





Vídeo nº 1 - "Ser Poeta" cantado por Luís Represas.
Vídeo retirado do Youtube



5- Trabalhos originais espalhados pelo país




Imagem nº 9 - Retrato confeccionado e apresentada numa exposição promovida no passado pela Biblioteca da Escola Florbela Espanca em Esmoriz e que também fora afixada pelo Agrupamento de Escolas de Maceda e Arada.
Retirada de: http://bibliotecademaceda.blogspot.pt/2012/02/florbela-espanca-exposicao-na-be.html, (Manuela Lima, professora-bibliotecária, foi a principal empreendedora desta iniciativa nobre).



Imagem nº 10 - Pintura sobre a sua moradia no lugar da Casela, igualmente afixada na exposição já mencionada.



Imagem nº 11 - Alguns dos seus bens pessoais que foram exemplarmente conservados.



Imagem nº 12 - Escultura de Florbela Espanca sentada em Oeiras.



Imagem nº 13 - Quadro inovador dedicado a Florbela Espanca, da autoria da pintora brasileira Teresinha Ávila (apelido - Tenini).




Imagem nº 14 - Pintura da autoria de Luísa Caetano que retrata todo o enorme conhecimento de Florbela Espanca.




Referências Consultadas:





Imagem nº 15 - Florbela Espanca deixou um legado incalculável à cultura portuguesa.


7 comentários:

  1. Olá

    Uma personagem algo inigmática que gostaria de conhecer melhor.
    Talvez um dia, quando o tempo «sobrar», me dedique a essa pesquisa.

    Cumprs
    Augusto

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  2. Mais sobre a passagem de Florbela Espanca por Esmoriz? Está vivo, ou viva, quem muito brincou com o criado preto que a Florbela tinha quando viveu em Esmoriz. A Florbela, de facto, enquanto por Esmoriz, viveu na casa aqui referenciada. Contudo, a casa de que ela gostava e onde passava muito do seu tempo era na outra casa da Casela. Na altura toda aquela área, com as três casas (a casa da Casela, a casa onde viveu a Florbela e a casa da Estrada Nova, que está abandonada, em frente à casa do senhor Américo) eram pertença do mesmo dono ou da mesma clã, como ainda hoje são da mesma família, muito mais ramificada, claro. Se a Florbela escreveu algum livro enquanto viveu em Esmoriz_ Escreveu a Charneca em Flôr. Eu ainda vi o original ou a cópia do mesmo. Basta ler esse livro para se identificar as paisagens da Casa da Casela e dos terrenos circundantes. Muito referida nos seus versos é a área da antiga Pia dos Cavalos, entre Gondezende e Paços de Brandão, a nascente de água que lá existia e o regueiro (charneca) que havia no fundo. Os fetos (flôr) referidos nos seus escritos são os fetos desse regueiro. Charneca em Flôr, portanto!

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  3. Gostei imenso do artigo. Está bastante esclarecedor, tendo em conta a documentação existente.
    A música do Luís Represas "Ser Poeta" foi uma excelente escolha.
    Parabéns.

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  4. A casa e da minha família,e também já lá vivi,o que querem fazer concretamente? Enviem me um mail e trato do assunto, cristovaocjgf@gmail.com obrigado e fico aguardar,caso não saibam tenho página no Facebook com nome i Love Esmoriz e já tenho muitos seguidores por isso falem comigo por lá em mensagem privada ou por mail,obrigado

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    1. Olá Cristóvão Ferreira,

      Nós aqui apenas sugerimos algumas ideias (que podem ou não ser viabilizadas por outrem), mas se existir alguém interessado em fazer algo mais por este assunto, decerto que o contactará, de forma a que possam combinar o que poderá ser feito na prática. Agradeço desde já o facto de ter deixado aqui o seu e-mail de contacto e de também ter uma página, onde promove a nossa linda cidade.

      Os melhores cumprimentos e continuação de bom trabalho

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  5. DOIS NOVOS PORMENORES A TER CONTA - ACTUALIZAÇÃO


    Como esta primeira reportagem foi bastante lida nos últimos tempos, recebemos reacções bastante positivas e até acedemos a novos pormenores, que seguramente interessam àqueles que querem abordar mais concretamente esta temática.

    Gostaria, por isso, de recordar mais dois pormenores:

    1- Para além da arte musical de Luís Represas, é necessário ainda salientar o trabalho de Cuca Roseta que interpreta, de forma maravilhosa, o soneto "Tortura" de Florbela Espanca. Podem consultar no seguinte link - http://www.youtube.com/watch?v=dFVakEjTfIw&feature=player_detailpage


    2- O anterior Presidente da Comissão de Melhoramentos de Esmoriz, Carlos Alexandre, lutou para que fosse criada uma placa na casa citada em cima com a seguinte inscrição "Aqui viveu Florbela Espanca". Infelizmente, o projecto fracassou, na altura, por questões financeiras. Contudo, o ex-Presidente acredita que agora há mais condições para que se proceda a esse pequeno (mas importante!) acto.

    Ficam aqui registados mais dois estes pormenores, os quais agradecemos!

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  6. Sinto-me imensamente grata aos que escreveram este artigo maravilhoso!
    Hoje ao acordar, recebi o poema "Fanatismo", cantado por um cantor brasileiro, que não deixa claro aos ouvintes, de quem é o poema. Ao pesquisar descobrimos, meu marido e eu, que é de Florbela Espanca. Estamos encantados com sua história e beleza...Obrigada por nos ajudarem nesta descoberta!

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