quarta-feira, 17 de abril de 2019

Habemus politicus inutilis (Opinião)

Quando rebenta surpreendentemente uma crise energética nacional de graves dimensões, capaz de colocar em causa a economia nacional e o funcionamento de alguns serviços do Estado (embora a Protecção Civil tenha sido salvaguardada), não há dúvidas de que se trata de um grande tiro nos pés de uma classe política, cuja credibilidade já é pouca, tendo em conta esta última década de extrema austeridade que motivou inúmeros sacrifícios por parte dos contribuintes portugueses.
O protesto do Sindicato dos motoristas de matérias perigosas é legítimo. O presidente do SNMMP (Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas) Francisco São Bento, afirmou junto do jornal digital "Observador", que a remuneração base destes motoristas ronda apenas os 630 euros de base, um valor que não representa os riscos e a responsabilidade a que os mais de 800 camionistas de matérias perigosas estão sujeitos diariamente. O responsável sindical defende salários na ordem dos 1200 euros, isto é, o dobro do vencimento, além de outras condições de trabalho que favoreçam a segurança dos motoristas. 
A soma exigida poderá ser certamente exagerada, contudo não me parece que 630 euros seja um salário que reflicta de forma justa o seu extenuante trabalho. É importante que o leitor tenha noção de que estes profissionais são obrigados a cumprir regras muito restritas, de forma a que conduzam de forma eficaz nas estradas porque um acidente basta para acontecer uma tragédia, dado que transportam matérias capazes de provocar várias mortes, sobretudo no caso de um embate inesperado e totalmente descontrolado.
E como já dissemos, são apenas 800 os elementos registados oficialmente nesta categoria profissional em concreto. O Governo e a ANTRAM (Associação Nacional de Transportes Públicos Rodoviários de Mercadorias; creio que se trata de um organismo de utilidade pública) deverão pois ceder nas reivindicações salariais, talvez não tanto como os sindicalistas defendem, pelo que não se compreende a sua intransigência inicial. Não será devido a um aumento salarial atribuído especificamente a centenas de trabalhadores que irá haver um impacto nefasto para a nossa economia. Agora se começa a faltar gasóleo, e depois gasolina, em vários postos, então aí sim os prejuízos serão descontrolados, e o próprio Estado perderá receita do IVA em muitos negócios que cairão por água abaixo.
O braço-de-ferro por parte do Partido Socialista (e sobretudo da própria ANTRAM) padece de argumentos, o Bloco de Esquerda e o PCP também apoiaram esta solução governativa e devem colaborar, como intermediários, para a resolução do problema. Por seu turno, PSD e CDS-PP olham para este momento como uma oportunidade para subirem nas sondagens, mas eles não se podem esquecer que as condições laborais destes profissionais não eram certamente melhores quando estiveram no governo entre 2011 e 2015. Ou seja, todos têm culpas no cartório no que diz respeito à precariedade destes profissionais.
Poderíamos apenas culpabilizar a ANTRAM por esta crise energética, mas achamos que isso seria focar apenas uma perspectiva incompleta da situação - aliás, consideramos que todos os responsáveis políticos deveriam ter evitado que isto tivesse tomado as proporções (até então impensáveis) que hoje todos assistimos. Bastava intermediar, reconhecer aqueles profissionais através de actos legislativos (porque as exigências vão além dos melhores salários exigidos àquela associação patronal!) e acima de tudo, não subestimar consequências futuras que pudessem ser graves.
Um sindicato nunca avançaria para uma greve desta importância se não tivessem sido feitos avisos ou tentativas prévias de diálogo. Eu reconheço que, por vezes, muitas destas organizações tomam posições extremas, absurdas e nefastamente persistentes em torno de causas absurdas ou insignificantes (como foi a questão das 35 horas ou da reposição dos feriados). Mas não é este o caso!
As reivindicações parecem ser justas, a greve aceita-se, mesmo que o seu impacto seja terrífico nos próximos dias!
O que já não se aceita é a passividade de uns partidos e determinadas entidades (só vão voltar a reunir-se com o sindicato na próxima quarta-feira? isto é, só daqui a uma semana?) e o aproveitamento político de outros, quando por causa de meia dúzia de trocos (é o que aparentemente significa para as contas globais), conseguem colocar em causa o funcionamento normal da economia nacional que já tem sido tão fustigada por impostos. Já para não falar da própria rotina dos cidadãos que ficará condicionada. 
Habemus politicus inutilis!



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Imagem nº 1 - Filas de veículos num posto de gasolina em Famalicão.
Foto da autoria de Miguel Pereira/Global Imagens



PS - Nalguns postos de gasolina do país, os preços dos combustíveis aumentaram consideravelmente, o que obrigou os portugueses a desembolsar mais dinheiro das suas já parcas carteiras... Isto é embaraçoso!

PS1- É importante ainda acrescentar que os sindicalistas pretendem igualmente um reconhecimento oficial da sua categoria profissional em termos legislativos/normativos, exigências feitas à ANTRAM e ao Governo.

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