A renovação da Cerca Sanitária até ao dia 17 de Abril foi uma decisão que mereceu o nosso apoio. Apesar das ligeiras melhorias dos últimos dias, acreditamos que seriam necessários mais alguns dias para consolidar e estabilizar o cenário de contenção de propagação do COVID-19. Era esse também o desejo do Presidente da Autarquia Vareira, Salvador Malheiro, e da equipa que o acompanha.
Mas de repente tudo mudou e as circunstâncias ultrapassaram mesmo a vontade do edil. Ao todo, mais de 20 empresas já obtiveram permissão para laborar, e alguns engarrafamentos de trânsito já foram observados em Maceda e em Ovar, nestes últimos dois dias. Até na cidade de Esmoriz, já denotamos mais movimento do que na semana anterior.
É certo que estas autorizações foram outorgadas pelo Governo, o qual atendeu ao impacto económico destas indústrias, embora não sendo essenciais à subsistência directa da comunidade. Obviamente, as decisões dos despachos recentes têm dado muito que falar. Por um lado, os detractores acreditam que as grandes empresas, detentoras de maior influência, estão a ser protegidas e levadas ao colo, enquanto que as pequenas e médias empresas estão a ser discriminadas, sendo que estas têm menos receitas ou capacidade de manobra num cenário de crise. Por outro lado, os defensores da medida governamental relembram que as empresas mais pujantes do concelho dão emprego a muita gente e que esta decisão poderá evitar ou, pelo menos, diminuir o número de despedimentos, além de que aquelas detêm peso para fazer reavivar o comércio e a economia locais.
Independentemente das interpretações de cada um, a Cerca Sanitária começa a assim a perder o seu efeito desejado. Não sabemos se a autarquia se envolveu em negociações com o Governo no que diz respeito à promulgação destes derradeiros despachos, ou se a iniciativa partiu directamente do Estado que atendeu às solicitações das empresas, adoptando tais procedimentos sem o conhecimento do executivo municipal.
A minha opinião é a de que o Governo se precipitou neste ponto porque não se tratam de empresas de bens-essenciais, e a sua reabertura deveria acontecer somente a 17 de Abril, ou em finais deste mês. Por outro lado, Salvador Malheiro que há poucos dias alertava para a realidade dramática vivida no concelho, já veio a público anunciar que deverá permitir a reabertura das indústrias logo depois da Páscoa. Ou seja, passamos de 8 para 80, o que não condiz com a renovação recente das medidas de contenção e isolamento social.
Depois de quinze dias de algum sucesso no que concerne à contenção do foco, a versão 2.0 da Cerca Sanitária é agora uma sombra da edição anterior, fazendo com que a realidade vivida no concelho se assemelhe cada vez mais ao Estado de Emergência Nacional vivido no país.
O Presidente da Câmara Municipal de Ovar não está numa posição fácil. Entre continuar a defender a integridade e saúde dos trabalhadores ou ceder às reivindicações mais veementes do tecido empresarial, Salvador Malheiro está a tentar procurar encontrar um meio-termo que agrade a todos, mas sabe que não é uma missão fácil. Não convém ignorar o empenho que dedicou, ao longo deste último mês, em prol da contenção dos focos do vírus. Superou as expectativas de muita gente e foi um dos rostos nacionais dessa luta, mas tem agora de se consciencializar que a realidade mudou e que, se calhar, vai ter que ponderar muito bem as próximas decisões. Não se avizinham tempos fáceis, e o contexto está sempre em constante mudança.
É que encontrar um meio-termo não é a mesma coisa que mantermos uma meia-Cerca Sanitária porque esta já se acha sabotada, a partir de agora, nas suas raízes.
Talvez seja melhor permitir a reabertura das empresas no dia 17 de Abril, e no final do mês ou início do mês posterior de Maio, autorizar os restantes sectores ou serviços a exercer as suas actividades, mas ainda proibindo eventos de lazer ou desportivos que concentrem aglomerados populacionais. Como é lógico, a reabertura gradual terá de ser acompanhada por medidas de prevenção (higiénica e distanciamento social mínimo entre as pessoas) e terá de haver uma monitorização constante das empresas (nomeadamente com a realização frequente de testes a grupos aleatórios de trabalhadores).
É nesse plano que a autarquia terá de começar a concentrar os seus esforços. Uma reabertura gradual e controlada das empresas, sem lesar consideravelmente a saúde dos trabalhadores, é agora o desafio que se impõe pela frente.
Mas até dia 17 de Abril, voltamos a reforçar o apelo para que as pessoas (aquelas que ainda estão dispensadas de trabalhar) fiquem em casa, realizando apenas as deslocações essenciais aos supermercados e farmácias.
Quanto mais melhorias significativas se registarem, mais fácil será o regresso à normalidade.
Créditos da Imagem: Estela Silva
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