Passaram 16 anos desde que o então primeiro-ministro, António Guterres, e José Sócrates, ministro do Ambiente, aterraram no campo de futebol de Esmoriz em dois helicópteros, após terem sobrevoado a Barrinha de Esmoriz. Numa tenda ao lado, decorria já o espectáculo “Abraço À Barrinha” com a presença do popular ‘Ecoman’, para gáudio de centenas de crianças. Estava tudo a postos para o arranque do projecto de despoluição da Barrinha de Esmoriz. Puro engano.
Esta sexta-feira, sensivelmente no mesmo cenário mas com outros protagonistas, deu-se início simbólico à empreitada de Requalificação e Valorização do “Sítio” da Barrinha de Esmoriz, avaliada em mais de 4,5 milhões de Euros.
“É um dos dias mais felizes da minha”, disse o presidente da Câmara Municipal de Ovar, “pois sou esmorizense e sinto muita nostalgia da minha Barrinha”.
Salvador Malheiro acredita na solução técnica, jurídica e ambiental para a Barrinha, chamando a atenção para a necessidade de eliminação das fontes poluidoras do ecossistema, lembrando que o Município de Ovar já o fez.
O ministro do Ambiente também esteve na cerimónia e comprometeu-se a voltar para inaugurar em bicicleta o passadiço que, em junho de 2017, ligará aquela zona ao concelho de Gaia.
João Pedro Matos Fernandes recordou algumas das experiências balneares que teve neste território durante a sua juventude e, em alusão à Semana da Mobilidade que hoje começa a ser assinalada em diversos municípios do país, propôs o passeio nesse percurso pedestre e ciclável como um contributo pessoal no sentido de reduzir as emissões poluentes para a atmosfera.
“Por altura dos santos populares – e aqui estou a responsabilizar essencialmente o empreiteiro, para que o calendário da obra seja cumprido – gostaria muito de vir de bicicleta de Gaia até à Barrinha de Esmoriz”, declarou.
Para o governante, o facto de o arranque dessa obra de valorização litoral coincidir com o início da Semana da Mobilidade assume particular simbolismo por constituir uma dupla oportunidade para “refletir” na forma como as populações se deslocam.
“Temos que andar menos de automóvel do que andamos hoje, sobretudo nos centros urbanos”, defendeu. “Temos que cumprir o acordo que Portugal assumiu em Paris no ano passado e reduzir em 25% as emissões atmosféricas, descobrindo outras formas de nos deslocarmos”, acrescentou.
Quanto ao território que agora começa a ser requalificado e cuja intervenção prevê a construção de percursos mistos que irão ligar o concelho de Ovar, na CIRA, aos concelhos de Espinho e Gaia, já na Área Metropolitana do Porto, Matos Fernandes reconheceu que essa zona é “a que mais sofre em toda a Europa com as consequências das alterações climáticas”.
“O mar está mesmo a avançar e faz-nos cada vez mais surpresas, mas não podemos imaginar que temos soluções mágicas e por isso é que é tão importante realizar obras como as que estamos a iniciar hoje”, afirmou.
O ministro do Ambiente elogiou, aliás, a postura de “camaradagem” adotada pelos municípios vizinhos de Ovar e Espinho para agilização de uma obra reclamada pelas populações locais há décadas e dificultada nos últimos anos por diversas questões legais.
Nesse sentido, Matos Fernandes anunciou que “na próxima semana” o Governo começará a discutir com a Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro (CIRA) os termos de uma futura delegação de competências nas autarquias para gestão dos respetivos territórios costeiros.
“Aquilo que está combinado é fazermos um contrato de parceria para uma experiência-piloto em que (…), uma vez aprovado o Plano de Ordenamento da Orla Costeira, o litoral venha a ser gerido pela CIRA”, disse o ministro. “A administração da Agência Portuguesa do Ambiente contactará a CIRA para discutir quem faz o quê e que responsabilidades financeiras serão atribuídas a cada um”, explicou.
Momentos antes, já Ribau Esteves, presidente dessa comunidade intermunicipal, tinha descrito a situação da Barrinha de Esmoriz e da Lagoa de Paramos como “uma nódoa negra” que manchou durante anos a reputação ambiental da região de Aveiro.
“Tudo o que é problema burocrático aconteceu nesta operação”, realçou Ribau Esteves, que é também vogal da sociedade Polis Litoral Ria de Aveiro, que coordena a empreitada em Ovar e Espinho.
Exemplos desses “disparates” foram a “absurda” exigência legal de um estudo à presença de lampreia na barra, com a inerente despesa que acabou por confirmar que não há no local “qualquer vestígio” dessa espécie, e o processo em tribunal para “desempatar a adjudicação” da empreitada e entregá-la à empresa ABB – Alexandre Barbosa Borges, SA.
Seis anos após o arranque de procedimentos para definição do projeto de requalificação, o presidente da CIRA defendeu, por isso: “Temos que exigir a quem legisla e a quem financia que seja mais rápido”.
A requalificação da Barrinha de Esmoriz e Lagoa de Paramos envolve um investimento que ronda os 3,38 milhões de euros e é comparticipada em 85% pelo Programa Operacional de Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos, sendo que os restantes 15% cabem à Polis Litoral, através dos municípios de Ovar e Espinho.
Reportagem do OvarNews
Texto e Foto retirados de OvarNews
O nosso comentário:
Em primeiro lugar, é de elogiar o início das obras que eram aguardadas já há muito tempo. Reconheço mérito, ao nível do capítulo da persistência, aos actuais autarcas de Ovar e Espinho e aos responsáveis da CIRA que desejavam visionar rapidamente as intervenções no terreno. No entanto, seria injusto da nossa parte não estender esse mesmo reconhecimento a muitos cidadãos, anónimos ou não, que sempre lutaram por este dia. Sem eles, nada disto seria possível. Em particular, gostaria de elogiar o Sr. Arménio Moreira, Presidente do Movimento Cívico Pró-Barrinha que foi, na minha opinião, um dos maiores defensores da causa da reabilitação da Barrinha. Desperdiçou anos infindáveis a exigir um futuro mais digno para a lagoa que, desde sempre, foi o seu amor de perdição.
Em segundo lugar, confesso que, ainda assim, estou algo céptico quanto à eficácia das obras. É verdade que, por um lado, a lagoa passará a ter estruturas de usufruto humano (ponte, cais, passadiços...), e isso será bom porque atrairá mais multidões a este espaço ambiental, contrariando o cenário de abandono e desinteresse que até então se verificava. No entanto, e abordando a temática por outro prisma, manifestamos ainda sérias dúvidas se os focos de poluição irão ser devidamente eliminados. Frisámos no passado e voltamos agora a fazê-lo - a ribeira de Rio Maior é, neste momento, o afluente poluidor da Barrinha. É certo que o Rio Lambo (também conhecido como Vala de Maceda) melhorou muito em termos de qualidade das águas desde que se encerrou uma malograda e disfuncional ETAR (Esmoriz-Cortegaça) bem como algumas actividades domésticas localizadas nas proximidades, mas a ribeira de Rio Maior continuou exactamente na mesma (ou até piorou!) visto que carrega actualmente uma poluição tremenda até à Barrinha. Aliás, esse pequeno curso de água apresenta águas tão escuras que, apesar do seu curtíssimo caudal, nem dá para visualizar a superfície submersa. Será esta ribeira requalificada pelo projecto em curso? Ou será apenas uma questão de tempo até que a Barrinha seja novamente inundada com a poluição proveniente deste riacho?
Em terceiro lugar, é essencial preservar o lado selvagem da lagoa e saber compatibilizá-lo com a presença humana. A Barrinha dispõe de uma vasta avifauna que convém salvaguardar. Espero que este pormenor seja levado em consideração.
Em quarto lugar, verifico algumas discrepâncias em relação ao exacto valor do investimento. Só no último mês, pudemos constatar em diversos artigos de imprensa uma incrível dissonância quanto ao custo da empreitada - 2,7 M, 3,3 M, 4,5 M (?)... Por uma questão de transparência, seria pertinente esclarecer definitivamente este detalhe para que todos tivéssemos conhecimento da verba oficial, mesmo sabendo que esta será comparticipada em 85% por fundos comunitários.
Em quinto lugar, e quanto ao projecto de ligação entre Vila Nova de Gaia e a Barrinha de Esmoriz através de passadiços, parece-me uma intenção interessante, mas que não é assim tão facilmente concretizável, pelo menos, a breve prazo! Mas é claro que seria uma excelente ideia!
Por fim, voltamos a reforçar aquilo que já dissemos em artigos anteriores - só daqui a dez anos é que poderemos medir, com precisão e distanciamento necessários, se as obras foram um sucesso ou se o seu impacto foi limitado.
Até lá, resta-nos a esperança de que, pelo menos, a Barrinha poderá "respirar" um pouquinho melhor nos próximos anos...
Foto retirada de: http://amigosdocaster.org/
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