Juízo de Bancada – 9 a 16 de Março
No programa «Juízo de Bancada» da Rádio Voz de Esmoriz (segundas-feiras, 21h30), são julgados ‘casos’da actualidade nacional e local, sendo que para caso há um veredicto: banco dos CÉUS (quando adecisão é positiva) ou banco dos RÉUS (quando a decisão é negativa). Este texto reflecte, em parte, os temas abordados no programa. Não se trata de um ensaio de rigor intelectual, é apenas um mero juízo feito por alguém que está na “bancada”.
Depois de várias semanas marcadas por casos de grande impacto mediático, esta semana foi, por comparação, mais tranquila. Ainda assim (e como sempre) muito foi acontecendo no nosso Portugal.
1. Em primeiro lugar, destacava duas breves notícias: a comemoração dos 70 anos da TAP e a saída de Belmiro de Azevedo da liderança da SONAE, pondo fim a uma carreira de 50 anos na empresa. Sobre Belmiro de Azevedo destaco a frontalidade com que foi tratando as mais diversas personalidades, não tendo medo de dizer o que pensava. Apesar de algumas derrotas, construiu carreira de relevo e merece portanto o devido reconhecimento. Banco dos CÉUS!
2. O segundo destaque vai para as sondagens do Jornal Expresso. No rescaldo da polémica entre Passos Coelho e a Segurança Social, 64% dos portugueses inquiridos não acreditaram nas justificações avançadas pelo Primeiro Ministro. Ainda assim, curiosamente, a maioria dos inquiridos entende que a autoridade política e moral de Passos não sai beliscada com esse episódio e 60% entendem que ele não se deve demitir. Apesar dessas boas notícias para Passos, quer ele, quer Cavaco Silva, não se livram de um verdadeiro trambolhão nas sondagens, caindo 2% e 5%, respectivamente. Banco dos RÉUS!
Pessoalmente, acredito que Passos fica com a imagem manchada e a credibilidade irremediavelmente afetada. Estou de acordo, no entanto, que o caso em si não teve gravidade suficiente para justificar uma hipotética demissão.
3. Ainda centrado na área política, não posso deixar de fazer uns comentários ao debate quinzenal no Parlamento. Esperava-se um PS e, em particular, um Ferro Rodrigues, com uma postura de rotweiller, mordendo e não largando a situação de Passos Coelho. Ora, em boa verdade, assistimos a um Ferro Rodrigues versão chiuaua. E a que se deve tamanha benevolência do líder parlamentar do PS? Não será certamente por falta de experiência, visto que tem mais de 40 anos de experiência em comícios e atividades partidárias. A explicação avançada é que o PS não está interessado em fazer uma “política de casos”. Houve quem não perdesse a oportunidade e, com humor, fizesse notar que depois da “política de casos” vem a política das “casinhas” onde alguns (leia-se, António Costa), terão andado a viver em duplexes construídos em violação de pareceres da própria Câmara Municipal de Lisboa. Mais, os jornais avançam mesmo que António Costa, por esse duplex situado na avenida mais cara do país, pagava de renda a módica quantia de 1100€ por mês. Diz o ditado que “quem tem telhados de vidro, não atira pedras ao telhado do vizinho”. Ou à segurança social dele... – Banco dos RÉUS!
4. Por falar em segurança, outro das notícias que chamou à atenção foi a nova proposta do estatuto da forças de segurança, onde o Governo propõe oferecer compensações monetárias ou conceder mais dias de férias aos agentes policiais que efectuem mais detenções e passem mais multas. Percebe-se o objetivo, mas pode estar a criar-se aqui uma motivação errada para a atuação das forças de segurança no domínio das multas. Várias estruturas sindicais vieram demonstrar a sua discordância, dizendo que se trata de uma proposta democraticamente grave – Banco dos RÉUS!
5. No âmbito da ação governativa foi ainda destaque a apresentação do programa VEM (Valorização do Empreendedorismo Emigrante), que visa apoiar projetos de portugueses que estejam no estrangeiro e queiram voltar para Portugal com ideias de negócio. A ideia em si é nobre e ambiciosa. Medidas que permitam aliciar portugueses a voltar ao País, devem ser encorajadas. Contudo, a forma atabalhoada, o escasso financiamento atribuído ao programa, bem como a necessidade das medidas estarem aprovadas até Junho, deixam no ar um certo cheiro a medida eleitoral, o que acaba por pôr em causa o verdadeiro mérito associado a esta medida. Banco dos RÉUS!
6. Da ação governativa passo para a justiça: tal como se esperava, o Supremo Tribunal de Justiça recusou o pedido de habeas corpus interposto pela defesa de José Sócrates, pelo que o ex-Primeiro-Ministro vai continuar detido em prisão preventiva. Tendo em conta os fundamentos alegados e os contornos que vão sendo conhecidos, é uma decisão que não surpreende. Banco dos CÉUS!
7. Mas o tema que merece a maior desenvolvimento é a criação e aprovação de um registo de pessoas condenadas por crimes sexuais contra menores, designadas vulgarmente por “listas de pedófilos”. A proposta em si mesma, sendo que tem por objectivo proteger as crianças, faz sentido. Aliás, é absolutamente inquestionável que se deve lutar por todos os mecanismos e instrumentos que permitam uma defesa apropriada das crianças. No entanto, tratando-se de um tema tão sensível, há que atender a todos lados da moeda. E, da proposta apresentada pela Ministra da Justiça, saltam logo à vista vários problemas. Não me quero deter nos detalhes eminentemente jurídicos, esses ficam para outros fóruns. Vamos pensar nos aspectos práticos desta proposta. Num país onde o próprio segredo de justiça anda pelas ruas da amargura, alguém duvida que mal a lista seja elaborada, no dia seguinte ela está na capa do Correio da Manhã? Mais, alguém duvida que quem receber a informação não a vai divulgar por todos os lugares, possíveis e imagináveis? E perante isto, o alarme social que se irá causar? Mais grave ainda, com a existência de tal lista, quantos problemas não vão surgir de informações falsas divulgadas na net, por qualquer pessoa, a coberto do manto do anonimato? Em casos limite, pode até dizer-se, sem grande exagero, que esta proposta pode reacender a velha noção do “fazer justiça pelas próprias mãos”. Note-se que não se trata aqui de defender ou dar primazia aos agressores. Trata-se sim, como sempre em Direito, de atender e ponderar todos os aspectos relevantes. É inegável que há que encontrar medidas adequadas à protecção das crianças. Contudo, esta proposta, da forma e com o conteúdo que apresenta, parece suscitar problemas de proporcionalidade e constitucionalidade. Não se trata, de todo, de uma questão pacífica, mesmo entre juristas. Parece-me então evidente que, face às dúvidas que se levantam, a proposta deve passar pelo crivo do Tribunal Constitucional. Mais uma vez, sendo a ideia louvável em si (por ter subjacente a protecção das crianças), o conteúdo da proposta acaba por não ser o adequado em virtude dos problemas que se levantam. Banco dos RÉUS!
8. Feita esta pequena análise a tema tão sensível e vasto, termino o meu apanhado da semana assinalando os dois anos de pontificado do Papa Francisco, um exemplo, não apenas para a comunidade católica, mas para o mundo em geral. Creio não exagerar se disser que ele é - pelo seu exemplo e pela sua actuação - a autoridade moral do Planeta. E que falta nos fazem mais exemplos deste calibre! Banco dos CÉUS. (há que admitir que neste contexto, o veredicto tem a sua graça…)
Muito mais havia a dizer, mas como o texto já vai longo, a hora é tardia, e a paciência dos leitores tem limites, despeço-me já, não sem antes convidar os interessados a passarem pela página do facebook do programa – facebook.com/juizodebancada
Até para a semana!
Emanuel Bandeira, Esmoriz, 16-03-2015
Imagem nº 1 - A longa e prestigiante carreira de Belmiro de Azevedo foi recordada no Programa "Juízo de Banca" da Rádio Voz de Esmoriz.
Foto extraída do Jornal Record (http://www.record.xl.pt/)
Nenhum comentário:
Postar um comentário