Hoje fomos confrontados com uma publicação nas redes sociais da autoria de Salvador Malheiro, Presidente da Câmara Municipal de Ovar, em que afirmava que Portugal estava pior que a Itália, e apresentou gráficos com as curvas evolutivas do concelho de Ovar, de Portugal e da Itália. O edil exigiu mesmo o shutdown do país.
Por um lado, tiramos o chapéu à forma prudente e exemplar como o autarca tem gerido a situação no concelho de Ovar (a qual é efectivamente preocupante) e ninguém pode negar que defendeu acerrimamente os direitos dos seus cidadãos, mérito que não pode ser colocado sob escrutínio.
Mas a verdade é que publicações, como a de hoje, poderão desgastar a estratégia comunicativa do município de Ovar, neste momento tão conturbado, e até gerar algum ambiente de mal-estar com outras estruturas e entidades superiores do país. Por conseguinte, a "união" ou "coesão" entre as instituições é, nestas alturas, essencial e, por isso, estes episódios são dispensáveis.
As comparações apresentadas assentam em critérios muito discutíveis: não faz sentido equiparar a realidade de um concelho com a de dois países. As dinâmicas populacionais são distintas, o quadro legal é diferente, os hábitos dos povos são diferentes... É uma comparação que vale o que vale. Na nossa opinião, a mesma não tem grande utilidade, acabando por gerar desnecessariamente mais alarmismo. Aliás, pensamos que a sociedade portuguesa já está a levar bem a sério os perigos do contágio provocado pelo vírus do COVID-19.
Quanto ao shutdown proposto pelo edil para o restante país, caso fosse para a frente, teria consequências económicas ainda mais catastróficas e irrecuperáveis (poderemos estar ainda a pagar o preço desta paralisação em 2030!). Todas as medidas sensatas já foram tomadas pelo Governo que só pecou por não ter agido mais cedo. Até o Estado de Emergência Nacional (que até poderia ter sido apenas decretado em Abril) já foi promulgado. Não vale a pena exigir que o país pare por inteiro. Há regiões do país (nomeadamente o Alentejo, o Algarve ou os arquipélagos), onde o vírus conhece ainda uma dimensão bastante reduzida. Penso que o shutdown total implicaria um aumento frenético do desemprego e comprometeria a capacidade de resposta do país neste momento crítico. O país tem de ter noção dos seus limites.
No que concerne à comparação com a Itália, não tem por onde se lhe pegue. Nas últimas 24 horas, morreram mil pessoas em Itália, dez vezes mais do que em Portugal até agora (100 óbitos até esta data, 5170 infectados).
Temos consciência de que a situação em Portugal irá agravar-se nos meses de Abril e Maio (e contra isso, não haverá muito mais a fazer), aproximando-se da realidade crítica que se vive em Espanha. Em algum momento, os médicos terão que começar a tomar decisões muito difíceis sobre quem devem salvar e aqueles que devem falecer. O número de mortes irá aumentar. É inevitável. Mas duvido que cheguemos, algum dia, ao estado em que se vive em Itália e nos Estados Unidos da América, onde a situação se descontrolou por inteiro.
A Itália e os Estados Unidos da América são países com populações mais expressivas e com maior tráfego social do que o nosso país, e isso explica muita coisa. Como é lógico, eles terão mais casos e mortes a registar. É tudo uma questão de demografia.
Quanto a Portugal, já se faz o que se pode. Pedir mais poderá significar - hipotecar o país durante esta nova década. Se tiver que ser feito, estou certo que isso acontecerá logo que o drama atinja proporções terríveis.
Voltando à opinião de Salvador Malheiro, não concordamos com ela, embora aceitemos que o autarca tenha sido um exemplo na forma como procurou proteger os cidadãos do seu concelho. Fez mais do que lhe era exigido. Os seus procedimentos são dignos de elogios por parte de todos.
Mas não pode cair no erro de pedir o impossível, adoptando gráficos que nem sequer sustentam solidamente a sua argumentação.
É necessária muita prudência, e claro está, alguma calma.
A nosso ver, os governantes devem saber manter a cabeça fria e agir conforme o contexto presenciado no momento.
A nosso ver, os governantes devem saber manter a cabeça fria e agir conforme o contexto presenciado no momento.
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